09/07/2021
Em 2020, o mundo foi assolado pela pandemia provocada pelo Covid-19 e, como meio de contenção do vírus medidas de isolamento e distanciamento social foram adotadas. Com isso, a atividade econômica apresentou quedas históricas e, com menos atividade, o cenário inflacionário permaneceu relativamente confortável.
O ano de 2021, no entanto, começou com perspectivas diferentes. Com o desenvolvimento de vacinas, com aceleração no processo de imunização e com a reabertura da atividade econômica em diversas localidades, a demanda começou a aumentar. Em paralelo, gargalos na oferta persistem, à medida que as indústrias tiveram suas produções interrompidas ou diminuídas com as medidas de distanciamento social e ainda não conseguiram acompanhar o aumento expressivo da demanda.
É diante desse cenário que a inflação mundial voltou a acelerar, levantando preocupações acerca da “reflação”. Objetivo deste comentário é mostrar um panorama do cenário inflacionário mundial, pois este tema preocupa os mercados por seu impacto na política monetária e nas taxas de juros dos países.
Conforme mencionado anteriormente, com a reabertura da atividade econômica, a demanda acelerou mundialmente e os preços de diversos produtos foram impactados. Os melhores exemplos foram as commodities, não apenas as energéticas, mas também as metálicas e agrícolas.
Além disso, em 2020 diversas medidas de isolamento social foram aplicadas, impactando diretamente a produção de serviços e de diversos bens industriais. Como resultado, gargalos na oferta de produtos foram criados e, com o aumento da demanda acima do esperado, esse é um processo que ainda não foi normalizado.
No Brasil, por exemplo, há uma interrupção na oferta de semicondutores – essenciais para a produção de veículos automotores. Com isso, a produção de diversas fábricas está paralisada e a Anfavea já revisou para baixo a produção do setor para o ano de 2021. Este não é um evento exclusivo do país, e está afetando diversas cadeias de produção mundial.
Percebe-se, então, que o aumento da demanda proveniente da reabertura econômica e os gargalos na oferta de produtos são fatores importantes na elevação dos preços mundiais. Não obstante, a retomada do setor de serviços – principal setor impactado pela pandemia – também tem papel primordial no aumento da inflação.
Como pode-se perceber na Figura 2, as principais economias mundiais têm apresentado elevação na inflação desde o início do ano. A perspectiva, no entanto, é de que os fatores mencionados acima sejam temporários, de modo que no próximo ano a inflação volte a normalizar nas principais economias.
Analisando mais a fundo o caso dos países emergentes, percebe-se que o panorama é semelhante. De maneira geral, todos os países apresentam aceleração da inflação. Destaque para o Brasil, cuja aceleração ocorre acima dos seus pares. No caso brasileiro, além dos fatores mencionados, a outro fator que preocupa: o ambiente climático e a condição hídrica mais adversa. Nota-se que o país foi o emergente que mais apresentou aumento no preço dos alimentos – impactados por condições climáticas.
Figura 2: Inflação países emergentes
Fonte: Bloomberg Elaboração: SOMMA Investimentos.
Figura 3: Inflação Alimentos – países emergentes
Fonte: Bloomberg. Elaboração: SOMMA Investimentos.
Mas afinal, por que a aceleração da inflação preocupa tanto os mercados? Além de diminuir o poder de compra do consumidor e poder atrapalhar a continuidade da recuperação econômica, uma inflação mais alta tem impactos na política monetária.
Isto é extremamente importante no caso dos EUA, por exemplo, dado que a sua política monetária influência a política monetária ao redor do mundo. No gráfico abaixo, por exemplo, é possível observar um aumento das Treasuries de 10 anos do país – em resposta ao aumento de inflação observado.
Diante deste cenário inflacionário mais alto, iniciaram-se as discussões sobre redução de estímulos e aumento de taxa de juros. No Brasil, por exemplo, o Banco Central já iniciou o ciclo de alta de juros, que deve terminar com Selic acima de 6,50% a.a. no final do ano. O mesmo movimento de alta deve ser observado nas principais economias emergentes, como pode ser observado na tabela abaixo.
Nos EUA, entretanto, os estímulos de as taxas não devem ser alterados até o final do ano. Apesar de alguns dirigentes do Banco Central norte-americano (Fed) já terem indicado que seria apropriado o início das discussões sobre redução de estímulos, foi acordado que o mais adequado seria esperar.
De acordo com eles, apesar da melhora da atividade econômica dos EUA, ainda persistem incertezas sobre a recuperação associadas à pandemia e ainda há um longo caminho para que a economia tenha atingido um progresso substancial e o pleno emprego. Ainda, apesar da aceleração da inflação estar ocorrendo acima do inicialmente esperado, a maioria acredita que ela ocorre por fatores temporários.
Com isso, esperamos que as taxas de juros sofram aumento apenas em 2023, enquanto o programa de redução de compra de ativos se inicie em 2022. Entretanto, o tapering deve ser anunciado com bastante antecedência, ou seja, ainda neste ano.
Por fim, na Europa o Banco Central Europeu também deve manter a política monetária acomodatícia. Nos últimos comunicados foram mencionados que todos os estímulos necessários serão utilizados para ajudar na recuperação economia. Ainda, na última semana a instituição mudou o seu objetivo de política monetária – a primeira modificação em 20 anos.
A autoridade monetária mudou o alvo de inflação de ‘abaixo, porém próximo de 2% no médio prazo’ para 2%. A nova estratégia é vista como uma permissão para o ECB deixar a inflação ultrapassar a meta de 2% quando achar necessário. Assim, espera-se que por lá a PM permaneça amplamente acomodatícia.
Nota-se, então, que, de fato, a inflação vem aumento mundialmente – resultando em discussões sobre alterações na política monetária. Entretanto, a maioria das autoridades monetárias acreditam que a aceleração inflacionária é temporária, reflexo do fechamento e da reabertura da atividade econômica em decorrência do Covid. Assim, a expectativa é que as principais economias desenvolvidas – EUA e Zona do Euro – permaneçam com a sua política monetária inalterada.
Nas economias emergentes, por outro lado o cenário é mais desafiador. Os países apresentaram aceleração inflacionária maior do que os países desenvolvidos, o que exige uma resposta mais incisiva das autoridades monetárias. No Brasil, a aceleração da inflação também está atrelada a fatores não relacionados com a pandemia e, por isso, esperamos que ela termine o ano em 6,5%. Diante disso, a resposta da política monetária também será mais rápida, de modo que esperamos Selic em 7,0% a.a. no final de 2021.